domingo, 13 de março de 2011

Pop trash art

Quentin Tarantino é, sem sombra de dúvida, um artista. Sua maneira de fazer cinema não consiste unicamente em contar uma história com início, meio e fim, que seja minimamente interessante ao espectador. Em suas produções, cada elemento parece ser milimetricamente estudado: a escolha dos atores, um enquadramento, cada uma das músicas ou das falas emitidas por seus personagens. É como se tudo tivesse uma razão de ser e de estar exatamente naquele lugar. Em um primeiro momento, ‘À Prova de Morte’ pode ser encarado como uma obra menor sua, diante do estardalhaço de ‘Pulp Fiction’ ou ‘Bastardos Inglórios’. Ao assisti-lo, porém, fica a impressão de ser um de seus filmes mais autorais.
Foram quase três anos até que ‘À Prova de Morte’ fosse finalmente lançado no Brasil. Culpa do fracasso nas bilheterias, ocasionado pelo projeto idealizado com o amigo Robert Rodriguez intitulado ‘Grindhouse’. A ideia consistia em recriar as sessões duplas de filmes B dos anos 70, com cada um produzindo um filme que reproduzisse a temática e estética da época. Até mesmo falsos trailers foram elaborados para dar mais gosto à brincadeira. O público norte-americano, contudo, não se divertiu tanto com as mais de três horas de projeção, obrigando os distribuidores a lançar os dois filmes separadamente.
A parte de Rodriguez, ‘Planeta Terror’, chegou às telas brasileiras ainda em 2008, com zumbis, jorros de sangue e uma mulher com uma metralhadora no lugar da perna. Tarantino seguiu uma linha menos gore e mais ao seu estilo, cheia de ironia, referências pop e diálogos marcantes. O que existe é um fio de história para o diretor exibir seus preciosismos: três garotas gostosas param em um bar para encher a cara e se divertir. Lá conhecem Stuntman Mike (ou ‘dublê Mike’, vivido com inigualável canastrice por Kurt Russell), sujeito esquisito que desfila em um carro ainda mais assustador. Na verdade, um psicopata que se diverte matando mulheres pelas estradas.
Todo o charme e a diversão de ‘À Prova de Morte’ está em seus pequenos detalhes: as frases de efeito, entoadas com a maior naturalidade, o erotismo contido nos enquadramentos femininos, as canções escolhidas a dedo em uma vasta discoteca, as mil e uma referências colhidas em filmes, seriados, quadrinhos e onde mais for possível. Como em uma obra de pop art, Tarantino faz uma estudada colagem de todos esses elementos, se divertindo como nunca com seu invejável arsenal. 
É uma pena que tudo isso não seja suficiente para sustentar o filme até seu final. A primeira parte, quando os personagens vão sendo calmamente apresentados e embalados pelos maneirismos do cineasta, é envolvente e divertida. Na segunda parte, parece que estamos diante de outro filme, enfadonho e sem graça, com seus intermináveis e entediantes diálogos. Apesar da discrepância, ‘À Prova de Morte’ vale como diversão de qualidade, feita por alguém que pode até brincar de fazer cinema. Mas faz com estilo, digno somente daqueles que conhecem a arte em sua essência.

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