sábado, 26 de março de 2011

Crônica de uma tragédia



Por mais traumático que tenha sido, não havia nenhuma dúvida de que, mais cedo ou mais tarde, o fatídico episódio de 11 de setembro seria alvo das investidas de Hollywood. Foram necessários cinco anos para que fosse colocado o dedo na ferida e a tragédia ganhasse as telas de cinema do mundo. Sob pontos de vista e abordagens diferentes, dois filmes sobre o assunto chegaram aos cinemas em 2006: ‘As Torres Gêmeas’, de Oliver Stone, e ‘Voo United 93’, de Paul Greengrass. Este último já está disponível em DVD e permite ao espectador embarcar em uma experiência das mais desconcertantes proporcionadas pelo cinema americano no ano que passou.
Dos quatro voos tomados por terroristas em 11 de setembro de 2001, apenas um não conseguiu atingir seu alvo (o World Trade Center e o Pentágono, atingido por três aeronaves): o voo 93 da United Airlines, que seguia em direção a São Francisco, mas caiu inexplicavelmente no estado da Pensilvânia. Segundo relatos de pessoas que mantiveram contato com quem esteve a bordo, passageiros teriam tomado a iniciativa de lutar contra os terroristas, a fim de evitar a tragédia. É essa história que o diretor recria, gerando uma obra extremamente tensa e perturbadora.
Como não existem informações precisas sobre o que de fato aconteceu naquele voo, Greengrass se baseou nos depoimentos de familiares das vítimas, juntamente com os de controladores de voo e profissionais que acompanharam o caos daquela manhã. A partir desses relatos, tomou a liberdade de fazer uma suposta reconstrução do que se passou dentro do avião e nos organismos de aviação americanos. Num estilo semidocumental, o diretor retrata quase que em tempo real o pesadelo vivido por dezenas de personagens envolvidas diretamente com o episódio.
O resultado são 111 minutos dos mais tensos e angustiantes. De início acompanhamos a tranquilidade dos passageiros ao embarcar para (o que seria) mais uma viagem, a preparação dos terroristas para o ataque e a situação de normalidade nos aeroportos. Aos poucos, à medida em que as coisas começam a fugir do controle, o espectador é tomado por uma sensação de agonia crescente. Os minutos parecem ganhar um redimensionamento, por vezes parecendo escassos demais, em outros casos dando a impressão de serem intermináveis.
À medida em que o filme se aproxima do fim, o cineasta intensifica sua habilidade de lidar com uma das sensações mais atemorizantes do ser humano: o medo e a percepção iminente da morte. O desespero dos passageiros que começam a ver suas vidas por um fio provoca sequências de arrepiar. O descontrole que toma conta das autoridades e técnicos do setor de aviação é o retrato de um caos para o qual ninguém estava preparado. A seqüência em que o segundo avião atinge as torres gêmeas é sintomática: não há palavras, apenas a imagem do inexplicável.
Outro mérito de ‘Voo United 93’ é não apelar para o ufanismo barato, tão comum às produções norte-americanas. Mesmo retratando a atitude dos passageiros como um ato de bravura, o diretor se esquiva de colocá-los em um pedestal, como heróis em defesa de um ideal. São apenas seres humanos, que ainda acreditavam que houvesse uma esperança de estenderem suas vidas. O final seco encerra aquilo que pode ser um golpe duro no espectador, mas do qual é impossível sentir-se indiferente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário