sábado, 19 de março de 2011

Retorno ao mundo do crime



Sou suspeito para falar de Martin Scorsese, meu grande ídolo no cinema desde que assisti a ‘Os Bons Companheiros’, aquela que considero sua obra-prima e uma das grandes joias da cinematografia contemporânea. Talvez por isso seja quase impossível para mim não gostar de seus filmes, mesmo os mais fracos. Definitivamente, não é o caso de ‘Os Infiltrados’, que rendeu-lhe um Oscar depois de muitos anos de espera. Nesse caso, fez-se justiça e a Academia de fato premiou um dos melhores filmes do ano passado.
Não é apenas pelo Oscar (quatro na verdade, incluindo melhor filme e diretor) que ‘Os Infiltrados’ representa uma guinada na carreira de Scorsese. Apesar do brilhante currículo, o diretor vinha de uma série de fracassos retumbantes de público e crítica, puxada por ‘Gangues de Nova York’ e ‘O Aviador’. Para tentar quebrar essa maldição, resolveu voltar a um universo que domina como poucos: o da criminalidade e da violência. E apostou em uma tendência crescente de Hollywood, a refilmagem de um filme oriental. É do outro lado do mundo que parecem estar os maiores lapsos de criatividade do cinema nos dias atuais.
‘Os Infiltrados’ revive a trama de ‘Conflitos Internos’, filme de Hong Kong que fez sucesso por lá, mas ainda é obscuro no Brasil. Esses conflitos, transpostos por Scorsese para Nova York, envolvem dois personagens principais: Billy Costigan (Leonardo DiCaprio), um policial que se infiltra na máfia irlandesa, e Colin Sullivan (Matt Damon), que faz o caminho inverso, sendo colocado por bandidos no meio da polícia. Quando os dois lados descobrem que existem intrusos em seu meio, caberá justamente a ambos descobrir quem são os infiltrados.
Apesar da maestria em construir imagens e desenvolver roteiros, a força dos filmes de Scorsese está em seus personagens, geralmente homens divididos entre o bem e o mal, torturados pela dúvida e em busca de explicações. No caso de Costigan e Sullivan, suas crises se apoiam na vida dupla que levam, na tensão diária a que estão submetidos e no desejo de um dia experimentar uma realidade convencional. Mais do que o conflito entre policiais e bandidos, o que sustenta o filme é o conflito psicológico, que faz com que os dois personagens principais se enfrentem sem sequer conhecerem o rosto um do outro.
Nisso é preciso dar o braço a torcer e reconhecer o mérito de DiCaprio e Damon, dois atores que até pouco tempo atrás eram capazes apenas de arrancar suspiros do público feminino. Amadurecidos, ambos conseguem imprimir a força necessária aos personagens, dando o tom exato entre cinismo, amargura e frieza. Não bastasse, contam com a presença sempre magnífica de Jack Nicholson, talvez a escolha mais acertada para viver Frank Costello, o mafioso que acolhe os dois personagens como seus pupilos.
De resto, ‘Os Infiltrados’ tem a marca de Scorsese: o ritmo ágil, a montagem vertiginosa, a violência impactante e a forte presença da trilha sonora. Os mal-humorados dizem que está longe de ser um dos melhores filmes de sua carreira. Ok, pode não ser um ‘Touro Indomável’ ou um ‘Taxi Driver’, mas é uma obra vigorosa, com os predicados de quem é, inegavelmente, um dos maiores cineastas vivos da história.

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