sábado, 19 de março de 2011

Depois da queda, a redenção



Redenção sempre foi um tema que cativou as plateias desde que o cinema é cinema. Até porque não há como não se emocionar com a história de alguém que desceu ao inferno e, graças ao seu esforço e as conjecturas do destino, se reergueu triunfalmente. Não raro, a fantasia se confunde com a realidade, como se o personagem das telas fosse uma encarnação de um herói de carne e osso. Foi mais ou menos assim que se deu a relação entre Mickey Rourke e ‘O Lutador’, filme pelo qual ele quase arrebatou um Oscar no início do ano.
Para entender esse paralelo, voltemos no tempo e cheguemos a meados dos anos 80. Mickey Rourke não era um astro top de linha, mas tinha tudo para seguir uma carreira promissora: bonitão, apareceu no estilo outsider em ‘O Selvagem da Motocicleta’, se notabilizou como o par romântico de Kim Basinger em ‘9 e ½ Semanas de Amor’ e ganhou alguns interessantes papéis de protagonista, como em ‘Coração Satânico’. Porém, vieram o álcool, as drogas e até uma tentativa de carreira como boxeador, que literalmente desfigurou seu rosto. Papeis medíocres em filmes ainda mais sepultaram o sonho do estrelato.
Veio o ano de 2008 e o cultuado diretor Darren Aronofsky o chamou para lhe devolver um papel de protagonista digno. Esse personagem é Randy ‘The Ram’ Robinson, um veterano astro de luta livre que começa a ver seu ocaso. Longe dos dias de glória, arranca alguns trocados com lutas sem muito glamour, que complementam o dinheiro ganho com alguns bicos. O corpo sente o peso da idade e definha quando Randy sofre um infarto, determinante para colocar um ponto final na carreira. É hora de ele buscar um novo caminho, na companhia de Cassidy (Marisa Tomei), stripper que faz as vezes de melhor amiga, e da filha de quem ele sempre se manteve distante.
Darren Aronofsky ganhou a fama com duas obras bastante peculiares, ‘Pi’ e ‘Réquiem para um Sonho’. As duas produções abusavam de recursos narrativos e estéticos diferenciados, como não linearidade, montagem acelerada, trilha sonora marcante e apuro visual. ‘O Lutador’ não tem nada disso. É uma história simples, com começo, meio e fim, contada sem exageros ou maneirismos. Sustentada em muito pelos atores, tem na humanidade a sua principal característica e ponto forte.
Como se fosse uma extensão de sua própria vida, Mickey Rourke encarna com perfeição o sujeito derrotado pela vida, cujos golpes do mundo real parecem mais doloridos do que os recebidos em cima do ringue. Em Marisa Tomei, atriz que a meu ver sempre foi subjugada por Hollywood, o diretor encontra o par perfeito para seu protagonista. Bonita e amargurada, suscita uma química às avessas, formando um casal que insiste em não se completar, por mais óbvio que isso pareça.
As cenas de luta são outro atrativo à parte. Mesmo revelando os famosos truques que fazem parte da luta livre, a câmera de Arronofsky mantém uma proximidade de seu personagem capaz de transpassar dor, cansaço e uma angústia que às vezes parece interminável. ‘O Lutador’ é envolvente porque, mesmo sendo um drama versando sobre desilusão, não sufoca o espectador. O final não foi tão feliz porque Rourke perdeu o Oscar para Sean Penn, mas nem sempre o roteiro da vida real é escrito em Hollywood.

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