sábado, 26 de março de 2011

O fenômeno Almodóvar



No que podemos chamar de ‘meio intelectualizado’, existem alguns fenômenos que extrapolam qualquer tentativa de explicá-los pelo raciocínio lógico. Um deles é a adoração quase religiosa pelo espanhol Pedro Almodóvar. Seus filmes são tidos como obras-primas quase que incontestáveis e cada novo lançamento é aguardado com a ansiedade de uma avó coruja pelo neto que vai nascer. Não que ache Almodóvar um mau cineasta, muito pelo contrário. Só não consigo enxergar a genialidade descomunal que crítica e moderninhos de plantão exaltam em sua obra. Pois bem, foi com essa rabugice que assisti a ‘Volver’, sua mais recente produção e objeto de desejo de 98% dos cinéfilos.
Antes que os fãs do espanhol me crucifiquem, permitam-me dizer que o considero um cineasta extremamente talentoso. Seus roteiros são invejavelmente bem-escritos, transformando histórias de folhetins novelescos em consistentes melodramas (no melhor sentido da palavra). Na direção de atores, raros são os nomes do cinema atual que dominam a técnica com tamanha eficácia. Por fim, sua sensibilidade garante muitas imagens de encher os olhos. Lamentavelmente, porém, não é sempre que o diretor consegue equilibrar todas essas virtudes.
Em ‘Volver’, Almodóvar retorna àquele que é o terreno em que transita com mais desenvoltura, o universo feminino. Raimunda (Penélope Cruz) é uma bela mulher que vive com a filha adolescente e o marido recém-desempregado, amparada pela irmã Sole (Lola Dueñas). Quando uma velha tia morre em seu vilarejo natal, sua mãe Irene (Carmen Maura), falecida há alguns anos, reaparece misteriosamente. A partir de uma série de acontecimentos, que é melhor não revelar aqui, as três gerações vão acertar algumas contas com o presente e o passado.
Como disse algumas linhas acima, um dos principais talentos de Almodóvar é a construção de melodramas. Melhor dizendo, de tragicomédias. Suas histórias se aproximam daquelas ouvidas e vivenciadas em nosso dia-a-dia, com alguns toques de surrealismo que ora provocam risos, ora levam às lágrimas. Esse talvez seja um dos motivos que levam tanta gente a adorar sua obra. São dramas semelhantes aos vistos na novela das oito, mas aos quais o diretor se dá a liberdade de tirar um clichê aqui, colocar uma pitada de exagero ali, tomar uma liberdade artística acolá.
Em ‘Volver’, a força motriz está nas atrizes. O trio formado por Penélope Cruz, Lola Dueñas e Carmen Maura protagoniza um verdadeiro duelo de interpretações, naquele estilo fiel ao espanhol, entre a sisudez e o caricato. Pena que o roteiro dessa vez não está à altura de seu elenco, se perdendo em algumas subtramas e colocando situações desnecessárias, que só servem para distrair a atenção do espectador. De resto, permanecem a fotografia pontuada por cores vibrantes e a bela trilha sonora.
No fim das contas, ‘Volver’ é um belo filme, mas ainda distante de um trabalho mais consistente como ‘Tudo Sobre Minha Mãe’ e que não se faz merecedor de tantas ovações entusiásticas. Repete uma fórmula eficaz, mas com apenas lampejos de genialidade.

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