sexta-feira, 18 de março de 2011

Suspense à moda antiga



Roman Polanski é um sujeito injustiçado. Não estou falando da acusação de violentar uma adolescente, pela qual responde há mais de 30 anos e está impedido de entrar nos Estados Unidos. Digo cinematograficamente falando mesmo. Sempre que recordamos os nomes dos grandes cineastas ainda vivos e em atividade, citamos Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Steven Spielberg... e seu nome acaba sendo esquecido. Mas quando se assiste a um filme como ‘O Escritor Fantasma’ e se recorda do passado do diretor, temos a dimensão do seu talento, por vezes relegado e ofuscado por razões que ainda não consigo entender direito.
Talvez porque Polanski nunca foi de fazer filmes grandiosos, se exibir na mídia, até por conta dos problemas relacionados à sua vida pessoal. Mas paremos um pouco para recordar: estamos falando do cara que fez ‘Repulsa ao Sexo’, ‘O Bebê de Rosemary’, ‘Chinatown’ e ‘O Pianista’. Quem dentre os diretores ainda na ativa tem um currículo que se aproxima disso? E ainda que apresente seus altos e baixos, como todo artista, não se pode dizer que em algum momento ele tenha perdido a mão para a sétima arte.
Berlim reconheceu esse talento em 2010, concedendo-lhe o prêmio de melhor direção no festival de cinema local por ‘O Escritor Fantasma’. Seu último filme não é apenas um retorno ao gênero que o consagrou no início de carreira, mas também evoca as obras do grande gênio do suspense, Alfred Hitchcock. Numa época em que sustos e sangue são as armas para cativar o público, Polanski faz um filme ao velho estilo, usando a velha e infalível arte de contar bem uma história misteriosa.
Escritor fantasma, ou ‘ghost writer’, para quem não sabe, é aquela pessoa paga para escrever um livro que será assinado por outro, em geral alguma celebridade que não tem familiaridade com a escrita. O personagem de nome desconhecido vivido por Ewan McGregor é um desses autores. Diante de uma oferta tentadora, ele aceita escrever a biografia do primeiro ministro inglês Adam Lang (o ex-James Bond Pierce Brosnan). Há um pequeno detalhe: o escritor contratado anteriormente para a função morreu afogado no mar, supostamente de forma acidental.
É claro que o espectador tem quase certeza de que essa morte não foi acidental. Assim como suspeita quando o novo escritor é roubado logo após fechar o contrato. E fica ainda mais intrigado à medida que pipocam denúncias relacionando o primeiro ministro com crimes de guerra no Iraque. São esses elementos, acrescidos um a um na história, que fazem de ‘O Escritor Fantasma’ um filme envolvente, que seduz o espectador à moda do cinema hitchcockiano, sem apelar a truques pirotécnicos ou distorções narrativas. 
Polanski conduz um espetáculo de ilusionismo preciso, com seus personagens dúbios, suas pistas falsas ou verdadeiras e a trilha sonora de Alexander Desplat. A música tensa e grandiloquente evoca mais uma vez Hitchcock e seu fiel escudeiro musical Bernard Hermann. A cena final, uma das melhores vistas nos últimos anos, resume a sensação de se assistir a ‘O Escritor Fantasma’: de que a verdadeira sétima arte e seus mentores ainda resistem.

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