sábado, 26 de março de 2011

À sombra de ‘Pulp Fiction’



O passar dos anos mostra que Quentin Tarantino conseguiu fazer de ‘Pulp Fiction’ aquele que talvez seja o grande clássico do cinema contemporâneo. A exemplo do que acontece com as obras-primas, o filme se tornou uma referência para dezenas de jovens diretores que vieram a seguir, que nele se inspiraram ou simplesmente tentaram copiá-lo. Como é da natureza, alguns tiveram menos sorte que outros. Sendo assim, podemos dizer que Paul McGuigan e seu ‘Xeque-Mate’ entram na relação dos menos afortunados.
Não que o filme seja um desastre. Com certeza, os discípulos de Tarantino já nos reservaram coisas bem mais nefastas do que este ‘Xeque-Mate’. Mas tendo em vista o elenco e a premissa que o diretor tinha em mãos, era de se esperar pelo menos um filme mais divertido. Uma comparação inevitável é com Guy Ritchie, autor de ‘Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes’ e ‘Snatch – Porcos e Diamantes’, dois subprodutos tarantinescos, mas com qualidades que deixam os fãs do gênero para lá de satisfeitos.
‘Xeque-Mate’ começa com um misterioso Bruce Willis numa cadeira de rodas contando para alguém a trágica história de um apostador que se deu muito mal ao se envolver com quem não deveria. Corta. Temos então Slevin (Josh Harnett), um jovem que por estar no local errado e na hora errada acaba sendo confundido com outra pessoa. Mais precisamente, com um sujeito que deve muito dinheiro para dois gângsteres rivais, O Chefe (Morgan Freeman) e O Rabino (Ben Kingsley). Mesmo não sendo quem esperam que seja, Slevin vai ter de se virar para pagar sua dívida em um curto espaço de tempo.
A partir de então, começa a brincadeira de surpreender o espectador. Cada seqüência vai deixando algo em aberto, uma pista para tentar enganar quem está acompanhando a história. Quando você pensa que sabe o que está acontecendo, surge alguma virada, como quem diz: “Ahá! Te peguei!”. Nesse festival de reviravoltas que por (poucas) vezes diverte e por (muitas) vezes cansa, o filme segue sua toada até o final surpreendente (mas nem tanto).
Os elementos do cinema de Tarantino estão todos presentes: os ângulos inusitados, a montagem ágil, a violência semigratuita, os diálogos aparentemente boçais, pontuados por referências à cultura pop. O problema é que a McGuigan sobra pretensão e falta habilidade para misturar esses ingredientes. Em primeiro lugar, falta o humor ácido e a ironia a que o diretor se pretende. Por muitas vezes os diálogos soam tolos, deslocados e enfadonhos, como que apenas para preencher o tempo. Já as reviravoltas da trama acabam se constituindo paradoxais: o diretor se esforça tanto em enganar o espectador, mas na hora de desvendar os segredos o faz da maneira mais óbvia possível.
Quanto aos atores, chega a ser deprimente ver Morgan Freeman e Ben Kingsley, dois gigantes na interpretação, repetindo clichês de uma ‘Tela Quente’ de ação qualquer. O mesmo acontece com Bruce Willis, tentando repetir os cacoetes de John Travolta em ‘Pulp Fiction’. Mas nesse caso a inexpressividade não chega exatamente a surpreender. Ah, ainda tem Lucy Liu, que entra e sai de cena sem justificar para que foi escalada. Parece que alguém precisa contar a essa nova geração de diretores que o cinema tem uma longa e riquíssima história antes da década de 90.

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