sexta-feira, 25 de março de 2011

Épico em tons de obra-prima


 
Da nova geração de cineastas norte-americanos, ninguém me impressiona mais do que o xará Paul Thomas Anderson. Em três pequenas obras-primas (‘Boogie Nights’, ‘Magnolia’ e ‘Embriagado de Amor’), o jovem diretor mostrou a que veio, assimilando com personalidade influências de gênios do cinema contemporâneo como Martin Scorsese e Robert Altman. O ingresso no primeiro time de Hollywood, porém, veio somente no ano passado, com a consagração de ‘Sangue Negro’. Era a prova que os críticos esperavam para comprovar que o diretor não era apenas uma revelação do circuito independente, mas alguém em condições de colocar seu nome no rol de grandes cineastas.
Exagero de minha parte? Creio que não, se considerarmos que se trata de alguém com apenas 38 anos, que desde os primeiros filmes demonstrou personalidade e uma habilidade incomum no trato com câmera e roteiros. ‘Boogie Nights’ incorporava até de maneira exagerada o estilo Scorsese, com uma montagem frenética indissociável da trilha sonora. Em ‘Magnolia’, a influência maior foi de Robert Altman e seus mosaicos de personagens que se entrecruzam. Com um estilo cada vez mais próprio, veio ‘Embriagado de Amor’, que subverteu os preceitos das comédias românticas. E, enfim, surgiu ‘Sangue Negro’.
Baseado no livro ‘Oil’, de Upton Sinclair, o filme enfoca a trajetória de um dos homens que conceberam a indústria petrolífera dos Estados Unidos no início do século 20. Daniel Plainview (Daniel Day-Lewis, premiado com o Oscar de melhor ator deste ano) é um empreendedor solitário e obstinado. Acompanhado do filho pequeno, vive de descobrir e explorar poços de petróleo, que logo o tornam um dos maiores nomes do ramo no País. A exploração de um novo negócio em um pequeno vilarejo vai colocá-lo para bater de frente com o pastor Eli (Paulo Dano, de ‘Pequena Miss Sunshine’), em um intenso embate mercadológico e moral.
Thomas Anderson deixa de lado as multifacetadas histórias contemporâneas para construir um épico nos moldes das grandes produções das décadas de 50 e 60, como ‘Cidadão Kane’ e ‘Assim Caminha a Humanidade’. Há uma grandiloqüência na composição das cenas, no uso da fotografia e da trilha sonora (composta por Jonny Greenwood, da banda Radiohead), que fazem com que o filme ganhe proporções de obra-prima.
Acima de tudo isso, porém, está alguém que dá a ‘Sangue Negro’ a força e o impacto necessários: Daniel Day-Lewis, que incorpora de maneira assombrosa o complexo personagem central. Seu Daniel Plainview é um sujeito de uma obstinação quase cega, que o faz trabalhar incessantemente e não medir esforços nem escrúpulos para atingir seus objetivos. No embate com o pastor Eli, cuja personalidade também tem suas ambigüidades, vemos um conflito impressionante de ideias, interesses e moralismos, que se resolverá apenas no surpreendente desfecho.
‘Sangue Negro’ confirma o amadurecimento de um cineasta cujo talento está muito acima da média, em um patamar diferenciado. Seu cinema é de alguém que tem pleno domínio da técnica, que sabe tirar o melhor de seus atores, que consegue contar uma história de maneira apaixonante. Em um cinema cada vez mais padronizado, tem tudo para se tornar um referencial às gerações futuras.

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