domingo, 27 de março de 2011

Convencional em demasia


Acreditava-se que de uns anos para cá a sempre tradicionalista Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, responsável pelo Oscar, havia respirado novos ares. A consagração de filmes como ‘Onde os Fracos Não Têm Vez’, ‘Quem Quer Ser um Milionário?’ e ‘Guerra ao Terror’ parecia indicar uma nova tendência entre os votantes, privilegiando um cinema mais autoral e menos conservador. Pois a edição de 2011 veio para jogar um balde de água fria nessas pretensões. Ao premiar ‘O Discurso do Rei’ como o melhor filme, a Academia voltou às suas raízes, consagrando o mais convencional entre todos os trabalhos que estavam na disputa.
‘O Discurso do Rei’ é daqueles filmes que seguem à risca uma fórmula para agradar ao público e fazê-lo se sentir um pouco mais instruído. Uma história edificante, de amizade e superação, com produção caprichada e pano de fundo histórico. Na síntese para venda aos espectadores, é a história do rei George VI, da Inglaterra, que teve de superar um problema comum a muitos dos pobres mortais, a gagueira.
Após experimentar inúmeros tratamentos sem sucesso, George (interpretado pelo britânico Colin Firth, que também arrebatou o Oscar por seu papel) é conduzido pela esposa (Helena Bonham Carter) ao excêntrico Lionel Logue (Geoffrey Rush), um terapeuta que se utiliza de métodos pouco convencionais para tratar seus pacientes. Da relação entre médico e paciente (ou príncipe e súdito) que começa reticente, nasce uma amizade que se intensifica à medida que George vê crescerem as possibilidades de assumir o trono da Inglaterra.
O diretor Tom Hooper e o roteirista David Seidler conduzem a história com o mesmo cuidado e rigidez com que são seguidos os protocolos da monarquia britânica. Tudo tem seu tempo exato e está no devido lugar. A reprodução de época, com os figurinos e direção de arte elaborados em seus mínimos detalhes, é impecável. A trilha sonora acompanha as ações no devido ritmo, intimista ou grandiloqüente conforme a necessidade. Até mesmo as emoções são milimetricamente calculadas, sempre preparando o espectador para rir, se concentrar ou se emocionar.
Convenhamos, é formalismo demais para uma produção cinematográfica. Apesar de alguns diálogos perspicazes, o roteiro é de uma previsibilidade extrema, sempre conduzindo a plateia para a solução mais acomodada. Tudo é didaticamente explicado, enquanto os conflitos internos da família real ou a tensão histórica às vésperas da Segunda Guerra Mundial passam ao largo e servem como mero complemento para uma narrativa mais preocupada com suas lições de humanidade. O que ainda garante alguma força a ‘O Discurso do Rei’ são as interpretações de Colin Firth e Geoffrey Rush, responsáveis pelos poucos momentos de improviso no filme.
Em comparação com seus concorrentes no Oscar, falta o vigor de ‘A Rede Social’, a ousadia de ‘Cisne Negro’, a inventividade de ‘A Origem’ ou mesmo a criatividade de ‘Toy Story 3’. O problema de ‘O Discurso do Rei’ não é ser um filme ruim, mas ser convencional demais, se equiparar a dezenas de outras produções que logo vão para o limbo do esquecimento.

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