terça-feira, 22 de março de 2011

Sob fogo cerrado



Em abril de 1999, dois estudantes armados invadiram uma escola no interior dos Estados Unidos e abriram fogo, matando 12 pessoas e ferindo outras 21. O episódio, que ficou conhecido como o massacre de Columbine, mexeu com os norte-americanos, os quais se viram repentinamente obrigados a refletir sobre o que se passa na cabeça de seus adolescentes e o perigo que representam armas de fogo nas mãos de cidadãos comuns. Passados seis anos, a discussão permanece atual e rende matéria-prima para o cinema. O mais recente produto dessa reflexão é ‘Pesadelo Americano’, que chegou discretamente nas videolocadoras, mas merece um olhar mais atento.
O longa que marca a estreia do jovem diretor Aric Arvelino sequer passou pelos cinemas brasileiros, sendo lançado diretamente em DVD com pouquíssima divulgação. Fato que causa certa estranheza dada a temática do filme e o elenco com nomes de respeito (Forest Whitaker, Donald Sutherland e Marcia Gay Harden). Na semana passada foi indicado para o Independent Awards, o Oscar do cinema independente americano, o que talvez possa despertar um pouco mais de interesse da mídia nacional.
O ponto de partida de ‘Pesadelo Americano’ é uma escola onde dois adolescentes promoveram uma chacina, numa referência explícita ao massacre de Columbine. A partir disso o roteiro costura a vida de vários personagens, todos de alguma maneira afetados pelo que aconteceu. Numa ponta vemos o diretor da escola, numa incansável luta para restabelecer a normalidade no local, a mãe e o irmão de um dos atiradores, que tentam se livrar do pesado fardo deixado pelo crime, e o policial atormentado por fantasmas que insistem em sugerir que ele poderia ter evitado a tragédia. Na outra ponta estão um garoto pobre que continua a ir armado para a escola e uma jovem universitária que, ao trabalhar na loja de armas do avô, começa a experimentar a sensação de poder que tais instrumentos podem assegurar.
Apesar de ambientado nos Estados Unidos, o filme acaba por retratar uma situação universal: tanto quanto a violência e a insegurança, o que une os personagens é a falta de diálogo. O mundo em que vivem amedronta, oprime, ameaça. Nesse cenário paranoico, o diretor se propõe a questionar a diferença que pode representar o indivíduo possuir ou não uma arma de fogo.
A estrutura narrativa chega a lembrar em muito à de ‘Crash – No Limite’, o grande vencedor do Oscar deste ano: um mosaico de personagens entrelaçados pelas tensões urbanas. Mas antes que se pense tratar de uma cópia, é bom lembrar: ‘Pesadelo Americano’ começou a ser produzido cerca de um ano antes de ‘Crash’, mas por problemas com a produção e a distribuição só chega às telas agora, depois do sucesso do primeiro.
O massacre de Columbine já deu origem a pelo menos dois filmes mais conhecidos. ‘Tiros em Columbine’, documentário que catapultou Michael Moore para o mundo, usava do episódio para questionar a política americana de comercialização de armas. Já ‘Elefante’, de Gus Van Sant, fazia uma abordagem mais poética do episódio, deixando ao espectador mais questionamentos do que reflexões. ‘Pesadelo Americano’ dosa um pouco de cada uma das receitas, com a vantagem de não ter o panfletarismo de Moore nem o pedantismo de Van Sant.

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