sábado, 12 de março de 2011

Os brutos também amam

 
Se existe alguém que jamais cansarei de elogiar, esse alguém é Clint Eastwood. Perto de completar 80 anos, o ator e cineasta mantém uma disposição invejável, tão profícua quanto qualificada. Se entre os anos 70 e início dos anos 80 se notabilizou por seus personagens, a partir do começo da década de 90 passou a se destacar na direção, com a maturidade de quem aprendeu com mestres como Sérgio Leone e Don Siegel. Por vezes abrindo mão de aparecer na tela, Eastwood jamais deixou de interpretar. A simbiose entre diretor e ator parece ter encontrado seu ápice em ‘Gran Torino’, onde essas duas personas se apresentam na sua melhor forma.
Em 2008, o diretor já havia nos brindado com um filme arrebatador que foi ‘A Troca’, no qual permaneceu apenas atrás das câmeras. ‘Gran Torino’ foi a sua contrapartida como ator, voltando a viver aquele tradicional personagem de Eastwood, que o consagrou desde suas primeiras aparições: o sujeito durão, calado, que mete medo em seus desafetos apenas com um olhar, mas preserva um afiado senso de humor. O mais incrível é que, por mais que seja o mesmo tipo, é um novo personagem, vivido com afinco e exuberância.
Clint agora é Walt Kowalski, ex-militar que lutou na Guerra da Coreia e acabou de perder a esposa. Amargurado, é o sujeito mais ranzinza que se possa conhecer: sempre reclamando e resmungando, não se dá bem com os filhos e tampouco com a vizinhança, formada quase que em sua totalidade por imigrantes asiáticos. É o típico sulista, que não faz a menor questão de esconder seu preconceito, disparando adjetivos pejorativos e fazendo piadas politicamente incorretas. Seus dias são preenchidos com conversas com sua cachorra, pequenas tarefas caseiras e o cuidado ao seu carro, o Gran Torino do título.
Ao salvar seu vizinho do ataque de uma gangue, Kowalski inicia uma amizade com a família de hmongs (povo originário da China, Tailândia e Laos). O velho vai amolecendo seu coração ao conviver com o jovem Thao e sua irmã Sue, a ponto de encarar criminosos armados para protegê-los. É aí que a história ganha novos contornos. Um acontecimento trágico vai dividir o velho Walt, entre permanecer como o combatente aposentado que quer paz ou reavivar seu espírito matador e partir para a guerra.
Assim como seus personagens, Clint Eastwood também é um tradicionalista na forma como conduz os filmes. Não há grandes efeitos, tramas intricadas, personagens em profusão. Suas histórias têm sempre começo, meio e fim, com os protagonistas em seus devidos lugares. O talento do diretor está em conduzir uma narrativa aparentemente simples e corriqueira de maneira a transformá-la em algo grandioso, épico. Com esmero e paciência, ele vai contando sua história sem pressa, valorizando pequenos detalhes e envolvendo o espectador aos poucos.
Se o diretor demonstra vigor invejável, o ator Clint Eastwood não faz por menos. Seu Walt Kowalski mantém a mesma panca do implacável policial Dirty Harry ou do cowboy Bill Munny, de ‘Os Imperdoáveis’. Com a diferença de que se situou nos tempos atuais, no qual parece não conseguir mais se ajustar. Esse encontro entre diretor e ator se resume num daqueles momentos únicos, que renovam a paixão e a fé na sétima arte.

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