sábado, 12 de março de 2011

A guerra sob outros olhos


Posso até soar um pouco machista, mas é difícil pensar em uma mulher dirigindo um filme de guerra. Não se trata de questionar sua capacidade como cineasta, mas é preciso concordar que o front de batalha é um ambiente que exala testosterona, formado por homens em uma situação limite, de tensão, fúria e confinamento psicológico. Pois a mulher que decidiu desafiar essa convenção se chama Kathryn Bigelow e seu resultado, ‘Guerra ao Terror’. Justiça seja feita, sua obra não deixa nada a desejar à de outros diretores machões. Mais do que isso, permite ver um tratamento diferenciado em relação às produções de guerra em geral.
Kathryn Bigelow pode ser considerada uma intrusa em território predominantemente masculino, o dos filmes de ação. Em seu currículo, o título mais célebre é ‘Caçadores de Emoção’, feito lá nos anos 90 com Keanu Reeves e Patrick Swayze, até pouco tempo atrás reprisado incansavelmente nas sessões da tarde. É alguém que sabe lidar sem pudor com o universo de tiros, brigas e explosões que fazem o deleite de muitos marmanjos. O que levaria a crer que ‘Guerra ao Terror’ seria um prato cheio aos sedentos por ação desenfreada. Ledo engano.
A diretora usou para seu filme um roteiro escrito pelo jornalista Mark Boal, que passou semanas em Bagdá, acompanhando especialistas no desarme de bombas. O intuito era relatar a extrema tensão em que vivem esses soldados, com a vida quase sempre por um fio (literalmente). Foram criados então três personagens, como exige a cartilha do cinema, com personalidades distintas. Eles formam um esquadrão antibombas que conta os dias que ainda restam para deixar a capital do Iraque.
O líder do grupo é o sargento William James (Jeremy Renner), aquele sujeito frio, que não se apega a formalidades e desarma uma bomba como quem brinca com um videogame. JT Sanborn (Anthony Mackie) é o cara disciplinado, dedicado e que, por conta disso, bate de frente com seu superior. Completa o trio o jovem Owen Eldridge (Brian Geraghty), inseguro, para quem a guerra é um misto de aventura e temeridade.
Durante as mais de duas horas de projeção, acompanhamos o cotidiano do trio, dividido entre as tensas atividades de batalha e os introspectivos momentos de solidão. No primeiro quesito, ‘Guerra ao Terror’ tem sequências de tirar o fôlego. Com a câmera colada a seus protagonistas, o espectador se vê como se aquelas bombas pudessem levá-lo pelos ares a qualquer momento. Ao contrário dos filmes de ação convencionais, a adrenalina está justamente no silêncio que precede os tiros e explosões.
Tão próxima quanto no front, a câmera está na intimidade dos personagens. Jovens confusos, que em um momento se veem tomados pelo instinto assassino e logo depois se perguntam o porquê de estarem lá. Uma sensação já retratada por outros diretores, mas que pelas mãos de Kathryn Bigelow é repassada de forma diferente, sem muito didatismo ou melodrama. Sem lágrimas, os olhares perdidos dizem mais do que qualquer diálogo moralista. Talvez aí percebemos porque a guerra seja algo tão estúpido quanto masculinizado.

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