quinta-feira, 10 de março de 2011

Tão longe, tão perto


Existe na ciência um estudo denominado teoria do caos, que vê a relação causa-efeito como as peças de um dominó, que à medida em que são derrubadas, vão gerando novos fatos e conseqüências. A definição mais famosa é aquela de que o bater das asas de uma borboleta nas Américas pode causar um tufão na China. É interessante observar como no chamado mundo globalizado, isso pode ser mais visível do que se imagina. Ao menos, é o que o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu nos tenta mostrar em ‘Babel’, sua mais recente produção, que encerra uma trilogia que, sob esse prisma, também poderia ser batizada de ‘trilogia do caos’.
Os dois primeiros filmes dessa trilogia são ‘Amores Brutos’, realizado ainda no México, e ’21 Gramas’, já produzido nos Estados Unidos. Em linhas gerais, os três filmes partem da mesma premissa. Um trágico acidente transforma a vida de diferentes pessoas, que não se conhecem e nada têm em comum. Em todos eles, o acaso separa vidas, detona crises, expõe feridas e faz com que a distância entre céu e inferno seja percorrida em questão de segundos.
Em ‘Babel’, temos um casal em crise (Brad Pitt, envelhecido, e Cate Blanchett) viajando pelo Marrocos. Dentro de um ônibus, a mulher é atingida por uma bala perdida, disparada por um garoto, filho de um pastor local. Enquanto isso, nos Estados Unidos, os filhos do casal estão sob os cuidados de uma babá mexicana (Adriana Barraza), que para acompanhar o casamento do filho, atravessa a fronteira com as crianças e o sobrinho (Gael Garcia Bernal). Acompanhamos ainda a história de uma jovem japonesa surda-muda (Rinko Kikuchi), que mais tarde também terá relação com o fatídico episódio.
Conforme a história bíblica, Babel era a cidade onde seria construída uma torre, mas como todos passaram a falar línguas diferentes, ninguém se entendeu e a construção foi abandonada. O título sintetiza a ideia principal do filme: a falta de comunicação e as dificuldades de se relacionar com outras culturas. No Marrocos, o casal americano sofre para conseguir ajuda médica em uma terra desconhecida. No México, os imigrantes enfrentam a intolerância das autoridades americanas. E no Japão, não se trata nem de questão lingüística, mas das barreiras para integração de uma jovem que não consegue ouvir nem falar.
Apesar da farta premiação (faturou o Oscar de melhor trilha sonora, o Globo de Ouro de filme dramático e três prêmios em Cannes), ‘Babel’ foi achincalhado pela crítica no Brasil, diferentemente dos dois filmes anteriores de Iñarritu. A meu ver, críticas injustas, já que a produção tem qualidades de sobra. O roteiro é bem construído, os atores têm ótimos desempenhos e a parte técnica é de primeira. Fotografia, montagem e trilha sonora contribuem sensivelmente para o tom de angústia predominante ao longo da história.
É bem verdade que o filme guarda uma certa carga de falso moralismo, pintando os mais poderosos como terríveis opressores e os mais pobres como vítimas indefesas. Não deixa de existir verdade nisso, mas quando se assume posições extremadas, sempre há o risco de se cair no maniqueísmo barato. De todo modo, ‘Babel’ é o retrato de uma sociedade contraditória, cada vez mais globalizada e mais dividida. Como aquela famosa frase, tão longe, tão perto.

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