Há quase que uma unanimidade da crítica, com a qual concordo plenamente, de que Ben Affleck é um dos piores atores de sua geração. Seja em papéis sérios ou cômicos, o cara definitivamente não serve para nenhum dos dois. Por mais que sejam situações diferentes, isso influencia (negativamente, no caso) quando você vê o nome de Affleck como diretor de um filme. Puro preconceito, afinal quantos bons atores não produziram bombas por trás das câmeras? Nesse caso, a situação é inversa: em ‘Medo da Verdade’, Ben Affleck demonstra na direção um talento jamais visto em toda sua carreira de ator.
Affleck se faz merecedor de um respeito ainda maior pela ousadia. Afinal de contas, não é qualquer estreante que se dispõe a adaptar uma obra do escritor norte-americano Dennis Lehane, autor do livro que deu origem ao espetacular ‘Sobre Meninos e Lobos’, de Clint Eastwood. Ou seja, além de escolher um escritor altamente respeitado, se colocou à mercê das expectativas e comparações com o trabalho de outro monstro sagrado do cinema. Se a comparação é inevitável, ‘Medo da Verdade’ (título bisonho para ‘Gone Baby Gone’) está aquém do filme de Eastwood, mas quebra a cara daqueles que esperavam algo medíocre.
No subúrbio de Boston (cenário habitual das obras de Dennis Lehane), a polícia investiga o desaparecimento de uma menina de oito anos. Sem maiores pistas do sumiço, a família da mãe contrata um detetive particular do bairro (Casey Affleck, irmão muito mais talentoso de Ben) que tem sua namorada (Michelle Monaghan) como assistente. Em sua investigação, ele vai contar com a ajuda de um policial (Ed Harris) e bater de frente com outro, responsável pela apuração do crime (Morgan Freeman).
Pode-se dizer que ‘Medo da Verdade’ se divide em dois filmes. Em sua primeira hora, segue como um drama policial comum, com uma trama de drogas e tipos suspeitos do submundo criminoso. Após um desfecho pretensamente falso, tem início uma outra narrativa, onde começam a ser reveladas outras facetas dos personagens, entram em cena conflitos éticos e morais, naquela velha linha do ‘nada é o que parece ser’.
Não li nenhum livro de Dennis Lehane, mas pelo que se percebe, são obras que se apoiam especialmente sobre traumas relacionados à infância. Seus personagens carregam consigo marcas de acontecimentos trágicos e perdas irreparáveis, tentando exorcizar fantasmas que não se vão. Ben Affleck consegue captar com eficiência esses sentimentos, enfatizando a angústia que consome os protagonistas através de uma narrativa sóbria e por vezes pessimista.
Um dos trunfos do estreante diretor é o elenco, liderado pelo seu irmão Casey, que com sua cara e voz de adolescente permanentemente em crise, transmite com precisão um misto de angústia e frieza. Ed Harris e Morgan Freeman dispensam comentários, são aqueles atores que mesmo representando o tipo mais chavão, conseguem fugir do senso comum. O desfecho deixa um ponto de interrogação ao espectador, colocando-o para pensar no que seria certo ou errado. Ponto para Affleck, que foge do tom manipulador e nos brinda com um filme corajoso e envolvente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário