sábado, 12 de março de 2011

Para confundir, não explicar

No futebol, não são raros os casos de jogadores que de repente surgem, encantam com belas exibições e se tornam promessas de craques. Pouco tempo depois, têm inexplicavelmente seu rendimento em queda, deixam de se firmar e terminam seus dias no limbo da mediocridade. No cinema esses casos também existem: cineastas que surgem com trabalhos promissores, alimentam expectativas e não conseguem sustentar a própria irregularidade. Steven Soderbergh, por exemplo: nasceu pujante do cinema independente, realizou trabalhos de qualidade no mainstream, mas logo caiu na vala comum. Hoje, desperdiça boas histórias como a de ‘O Desinformante!’ para um público incerto.
Soderbergh emergiu em um Festival de Cannes com ‘Sexo, Mentiras e Videotape’, galgou seu lugar e teve seu ápice com ‘Traffic’, um envolvente policial que lhe conferiu o Oscar de melhor diretor. Ali, imaginou-se alguém que ingressava no panteão dos grandes diretores contemporâneos. Porém, o que se viu foi um cineasta dividido entre grandes produções, como a série ‘Onze Homens e um Segredo’, e filmes mais autorais, como ‘Che’, sem uma identidade bem definida. E o que é pior, sem momentos de maior brilhantismo.
Mas vamos a ‘O Desinformante!’, que pode ser enquadrado no meio termo entre essas duas vertentes. Apesar de ter um astro de primeira linha como protagonista (Matt Damon), o filme não tem aquilo que pode se considerar como um bom apelo popular. A história é interessante, baseada em fatos reais: Damon vive Mark Whitcare, vice-presidente de uma grande indústria alimentícia americana na década de 90. Questionado pelo FBI sobre um suposto caso de espionagem industrial, o executivo resolve ir mais longe: revela um esquema de cartelização de preços e se dispõe a colaborar como informante.
A grande chave do filme é seu personagem principal, pelo simples motivo de que se trata de um mentiroso compulsivo. Logo, o que pode ser uma grave denúncia também pode ser fruto de sua fantasiosa imaginação. Tanto que em pouco tempo o feitiço vira contra o feiticeiro e Whitcare deixa de ser acusador para se transformar em acusado. Tantas nuances, porém, não conseguiram ser dimensionadas por Soderbergh e Damon, que perdem a mão e deixam o espectador mais confuso do que envolvido com a trama.
Possivelmente, a ideia foi de transmitir à plateia a mesma confusão causada pelo protagonista em seus interlocutores. Ainda que o espectador tenha a vantagem de ouvir o que se passa na cabeça de Whitcare, através de uma narração em off, nada é muito claro até a metade do filme. Aliás, tudo é muito intricado, suscitando preguiça ao invés de interesse. E ainda que se esforce, Matt Damon não consegue ir além de uma interpretação burocrática, que não imprime carisma nenhum a seu personagem.
O resultado final é um filme mediano, que pouco diverte, mas também não se leva tão a sério. E deixa mais um ponto de interrogação sobre o que teria acontecido com Soderbergh, que há muito tempo parece ter ligado o piloto automático. Numa época em que a criatividade é cada vez mais exigida no meio cinematográfico, o diretor parece conformado em ser apenas mais um na multidão.

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