sábado, 12 de março de 2011

Para aguçar os sentidos


Por circunstâncias às quais todo cinéfilo que habita Ponta Grossa está submetido, somente nos primeiros dias de 2011 consegui assistir a um filme que aguardei para ver durante todo o ano de 2010. Apesar do título novelesco (salvo engano, houve de fato uma novela global com esse nome), ‘Direito de Amar’ está longe de ser um melodrama açucarado. Mais uma vez, somos obrigados a dar um desconto aos nossos geniais distribuidores e abrir os olhos para uma produção que tem dois chamarizes principais: a estreia do renomado estilista norte-americano Tom Ford no cinema e a marcante interpretação de Colin Firth, indicado ao Oscar do ano passado.
Baseado no livro ‘A Single Man’, de Christopher Isherwood, ‘Direito de Amar’ narra um dia na vida de seu personagem principal. Não é um dia qualquer, assim como não é uma pessoa qualquer. George (Colin Firth) é um professor homossexual do início dos anos 60. O dia em questão é aquele que decide ser o último de sua vida, planejando o suicídio para as horas finais. A dificuldade em superar o trauma da morte do companheiro com quem viveu 16 anos é motivo suficiente para levá-lo ao limite.
Um dia pode ser pouco diante de uma vida inteira, mas é tempo suficiente para que muita coisa aconteça. Como a aproximação de um introvertido aluno (Nicholas Hout), cioso em desvendar segredos da personalidade de George. Ou então o encontro fortuito com um estudante espanhol, cheio de tensão e insinuações. E, finalmente, o jantar agendado logo no início do dia com Charley (Julianne Moore, uma espécie de Meryl Streep alternativa), amiga de longa data, cuja relação parece tão sincera quanto cercada de mistério.
Como era de se esperar de alguém que trabalha com moda, ‘Direito de Amar’ possui um encanto visual extremo, por vezes até exagerado. Muitas cenas são construídas com esmero, estudando cautelosamente cada enquadramento, as cores que variam conforme o contexto temporal e psicológico, a feição dos personagens. Imagens que em algumas oportunidades expressam mais do que os diálogos.
Tom Ford, juntamente com o roteirista David Scearce, elaboraram um roteiro no qual muito do que se diz não sai da boca dos personagens. Não há necessidade de entregar diretamente ao espectador tudo que se passa na cabeça de seus protagonistas Olhares, sorrisos, gestos, frases incompletas e expressões dúbias dão a deixa para que se aprecie muito mais aquilo que fica subentendido do que o propriamente dito. E Colin Firth, com seu personagem cheio de nuances, é um prato cheio para esse envolvente jogo de cena. 
É bem verdade que em alguns momentos o preciosismo do estreante diretor chega a incomodar um pouco, chegando a soar pretensioso de certa forma. Mas há um fator que rapidamente nos faz relevar qualquer deslize: a trilha sonora de Abel Korzeniowski. Poucas vezes no cinema recente vi um filme em que a música conduz a trama de forma tão magistral, funcionando quase como uma narrativa própria. Se fosse para resumi-lo em apenas uma frase, diria que ‘Direito de Amar’ é um filme para aguçar os sentidos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário