sábado, 12 de março de 2011

Os monstros da infância

O alerta do diretor Spike Jonze serve como orientação aos pais mais desavisados: ‘Onde Vivem os Monstros’ é um filme sobre infância, não para crianças. Por ser a adaptação de um famoso livro infantil e apresentar em sua capa monstros fofinhos, é natural que os pequenos se interessem e os pais levem na expectativa de passarem juntos alguns momentos de diversão. Não que o filme não seja recomendado a crianças, mas se trata de uma produção razoavelmente mais complexa do que aquelas que levam a alcunha ‘infantil’. As crianças podem até se divertir, mas é mais provável que os adultos se sensibilizem com a história simples e recheada de simbolismos.
‘Onde Vivem os Monstros’, o livro de Maurice Sendak, se tornou um fenômeno nos anos 1960 ao apresentar com poesia e ilustrações a história de um garoto que foge de casa para se tornar rei em uma terra habitada por criaturas gigantes. De maneira simples, mas lírica, o autor aborda a rebeldia infantil e os controversos limites entre liberdade e obediência. O desafio de transpor a história para as telas ficou a cargo do cultuado Spike Jonze (de ‘Quero Ser John Malkovich), com o auxílio do próprio escritor.
Não seria uma tarefa fácil, convenhamos. Afinal, o livro tem cerca de 40 páginas e uma história cuja leitura se esgota rapidamente. Como preencher então aproximadamente uma hora e meia de projeção sem encher linguiça? A solução foi intensificar os conflitos, tornar mais complexa a jornada de Max, um garoto que se desentende com a irmã, briga com a mãe e, num ato de rebeldia, pega um barco sem direção. Ele acaba aportando em uma ilha, onde vive um grupo de solitários monstros gigantes.
As criaturas estão à espera de um rei, que possa trazer felicidade às suas vidas. Ao perceber que pode assumir essa condição, Max se apresenta como o novo rei e experimenta a sensação de autoridade. É ele quem determina tudo a ser feito no reino, ordenando corridas pela floresta, guerras de lama e a construção de um forte de madeira. Para ele, tudo é possível na construção de um mundo inverso àquele de onde veio, estabelecendo a sua maneira de ser feliz.
Por mais simples que seja, a história de ‘Onde Vivem os Monstros’ é recheada de significados. Cada um dos monstros com quem Max convive tem uma personalidade, que representaria um sentimento, universal ou do garoto. O mais impressionante, contudo, é que sob sua aparência assustadora todos eles escondem uma fragilidade enorme. Por mais que Max se esforce em construir um reino onde predomine a felicidade, os planos sempre esbarram nas diferenças. Assim como no mundo real.
Uma das críticas mais interessantes que li a respeito de ‘Onde Vivem os Monstros’ é de que se trata de um filme sobre o tato, esse sentido tão aguçado durante a infância. As brincadeiras de se bater uns nos outros, a dor de um gesto mais agressivo, o abraço no momento de carência, a alegria de dormirem todos amontoados. É um filme que fala muito mais através daquilo que não é dito. E que, por isso mesmo, mexe com as emoções de maneira sutil, porém marcante.

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