quinta-feira, 10 de março de 2011

O politicamente incorreto contra-ataca

Quando se apresentou ao mundo com ‘Borat’, o comediante inglês Sacha Baron Cohen mostrou seu cartão de visitas. Com um humor politicamente correto, por muitas vezes grosseiro, envergou um gênero que arranca risos da vida real, fazendo com que as pessoas acabem expondo seus preconceitos e sua visão torpe da realidade. Apesar de algumas ressalvas, o modelo funcionou bem e rendeu uma experiência bastante interessante. Mal sabia o mundo que três anos depois a dose se repetiria de forma bem mais intensa. Até demais. ‘Brüno’, seu filme mais recente, eleva seu despudor ao cubo e acaba passando dos limites.
Baron Cohen testa o público com uma fórmula que não estabelece um limite bem claro entre ficção e realidade. Ele cria um personagem fora do normal e sai às ruas assumindo a identidade dessa persona. Ninguém, além do espectador que verá o filme posteriormente, sabe que é tudo zoeira. Assim, os entrevistados reais se entregam traídos por suas próprias convicções. Em ‘Borat’, seu personagem era um repórter do Cazaquistão que entregava os preconceitos e irracionalidades do ‘american way of life’. ‘Brüno’ tem como missão expor a homofobia carregada pelos norte-americanos, seja implícita ou assumida.
Brüno é um homossexual austríaco que apresenta um programa de televisão sobre moda. Após alguns incidentes, ele é demitido e resolve sair pelo mundo com a missão de se tornar ‘a maior celebridade austríaca desde Hitler’. Começa a partir daí um roteiro que inclui situações surreais no Oriente Médio, África e, finalmente, Estados Unidos. Obcecado pela fama e pelo universo das celebridades, ele busca as mais inusitadas formas de se tornar um ídolo.
Claro que tudo faz parte de um teste para verificar até onde vão os limites desse mundo em que o dinheiro e os holofotes contam mais do que qualquer coisa. A estratégia de Baron Cohen funciona quando ele aborda a futilidade presente nesse meio, como na cena em que entrevista uma modelo falando das dificuldades da profissão. Ou então quando propõe um programa bizarro a produtores de TV norte-americanos. Por mais que seja a exploração da chamada ‘vergonha alheia’, é um riso aceitável.
Mas o ator extrapola quando tenta expor novamente alguns preconceitos e conceitos distorcidos da sociedade. Por exemplo, ao adotar uma criança negra na África e expô-la como um produto adquirido numa feira livre (ele diz que trocou-a por um Ipod). Ou então quando agenda uma entrevista com a cantora Paula Abdul e faz com que mexicanos sirvam de assentos para a gravação. É um humor cruel, que causa constrangimento não pelo seu alvo, que são os preconceituosos, mas por aqueles que estão expostos.
No fim das contas, ‘Brüno’ é bem-sucedido na sua ideia de desmascarar o preconceito contra os homossexuais. A presença de um pastor que ‘cura’ gays e a sequência final, em uma arena masculinizada, são emblemáticas. Contudo, é um tipo de humor maquiavélico, em que os fins justificam os meios. Mesmo que sejam meios grosseiros, politicamente incorretos e desprovidos de bom senso. Pode cumprir seus objetivos, mas na maior parte apenas provoca como uma criança mal-educada.

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