quinta-feira, 10 de março de 2011

O bom e velho oeste


O western é um gênero curioso. Sem gozar da popularidade que já teve no passado, representa uma espécie de mito para os cineastas contemporâneos. Quem se aventura em retomar esse estilo sempre mantém um respeito excessivo aos grandes clássicos, não se arriscando a reinventá-lo, mesmo que o cinema tenha se transformado ao longo de tantas décadas. Suponho que não seria Ed Harris, ator de talento, mas novato como diretor, que iria encarar o desafio. Melhor assim. ‘Appaloosa – Uma Cidade Sem Lei’ é um dos faroestes mais competentes da década atual, que mantém o clima de nostalgia e acrescenta algumas pitadas de contemporaneidade.
Ed Harris é um cara que parece se aventurar na direção somente em projetos pessoais, para os quais têm em mente o que quer fazer, para quem e de que maneira. Assim foi no regular ‘Pollock’, no qual, movido pela admiração pelo artista plástico Jason Pollock, produziu, dirigiu e protagonizou sua autobiografia. Em ‘Appaloosa’, o objeto de desejo era o livro homônimo de Robert B. Parker. Dessa vez, acrescentou à lista de funções a de roteirista, adaptando a história em parceria com Robert Knott.
A história é tradicional dos westerns. Virgil Cole (Harris) e Everett Hitch (Viggo Mortensen) são pistoleiros habilidosos que chegam à cidade de Appaloosa com a tarefa de colocar ordem no local. O inimigo é o brutal fazendeiro Randall Bragg (Jeremy Irons), que se adonou ainda mais do vilarejo após matar o último xerife. Como todo bom cowboy que se preze, a dupla institui as suas regras para fazer valer a lei e acabar com a bandidagem. Não bastasse esse conflito, outro se arma quando desembarca na cidade a jovem viúva Allis French (Renée Zelwegger), que vai balançar o coração do durão Cole.
Não há como não encontrar em ‘Appaloosa’ ecos dos mais tradicionais faroestes. Cole e Hitch incorporam o estereótipo do pistoleiro padrão: falam pouco, mantêm o passado envolto em mistério, são frios e precisos naquilo que sabem. Brigas no bar, perseguições a cavalo, duelos e trens se incorporam naturalmente à história, sempre dividida entre o conflito masculino, com suas armas em punho, e os dilemas da presença feminina.
Mas Harris não poderia deixar de respirar os ares dos novos tempos, fazer uma obra meramente nostálgica sem se contaminar por um espírito contemporâneo. Diferente dos westerns que arrebanhavam plateias no passado, ‘Appaloosa’ não exala testosterona. As brigas e tiroteios acontecem em doses mais moderadas, contendo a violência para explorar o interior dos personagens. Apesar de durões, Cole e Hitch não são a fortaleza que já representaram Clint Eastwood, Charles Bronson ou John Wayne. Se com a pistola em punho não hesitam, quando o assunto é sentimento, fraquejam e se deixam vencer.
Mas o que mais chama a atenção é a figura feminina incorporada por Renée Zelwegger. Longe daquela mulher frágil e insegura, ela é movida pelo desejo e por uma independência inimaginável para os padrões do velho oeste. Sem romper com a tradição, Ed Harris nos brindou com um filme, no mínimo, digno. Além do mais, rever Jeremy Irons interpretando um vilão sempre é algo que vale a pena.

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