sábado, 12 de março de 2011

Humor com ousadia


Jim Carrey é aquele típico caso do “ame ou odeie”. Como comediante, se notabilizou pelo tipo exagerado, usando e abusando de caretas e trejeitos para arrancar risos do público. Isso fez com que muita gente sequer se desse ao trabalho de vê-lo em seus papéis sérios, diga-se de passagem muito bem interpretados, como em ‘Show de Truman’, ‘O Mundo de Andy’ e ‘Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças’. Seu mais recente filme, ‘O Golpista do Ano’, não se enquadra em nenhuma das duas categorias: não chega a ser um papel totalmente sério, mas quando é para fazer rir, Carrey quase não exercita suas macaquices. O que não o livra da possibilidade de rejeição, por outros motivos.
Em ‘O Golpista do Ano’, o ator desempenha seu papel mais ousado: o de um homossexual assumido. Diferente do que se possa imaginar, não se trata de um personagem caricato, amparado no humor grosseiro, passível de estimular protestos da comunidade gay. Ainda que com alguma afetação, sua interpretação não é mais um estereótipo. Mais do que isso, Carrey não se incomodou em protagonizar cenas tórridas com outros dois atores famosos: Ewan McGregor (apesar de vários papéis, sempre lembrado como o protagonista de ‘Trainspotting’) e o brasileiro Rodrigo Santoro.
Baseado em uma história real (garantem os produtores), o filme traz Jim Carrey como Steven Russell, policial, religioso e pai de família, que após um acidente de carro decide assumir sem medo sua homossexualidade. Ele passa então a viver de trambiques, arruma um namorado (Rodrigo Santoro) e um dia vai parar na cadeia. Lá conhece Philip Morris (Ewan McGregor), com quem inicia uma relação duradoura ainda na prisão. Fora das grades, Steven mantém a vida de golpes e o relacionamento, pelo menos até onde é possível conciliar as duas coisas.
Estreia na direção de Glenn Ficarra e John Recqua (roteiristas de ‘Papai Noel às Avessas’, entre outras produções), ‘O Golpista do Ano’ não se mantém preso a um único estilo. Misto de comédia, filme policial, drama e romance, consegue prender a atenção graças a seu engenhoso roteiro, que sempre reserva alguma reviravolta quando o espectador está prestes a se acomodar. E para quem se incomoda com as caretas de Jim Carrey, seu humor, às vezes politicamente incorreto, vem mais das situações absurdas da trama do que dos trejeitos de seu protagonista. 
O que causa maior surpresa e espanto é que, mesmo tendo uma história acessível e um astro de primeira grandeza no elenco, o filme encontrou grandes dificuldades para ser distribuído nos Estados Unidos. Tanto que foi lançado antes no Brasil, por incrível que pareça. Justamente aí reside o maior mérito de ‘O Grande Golpista’: se não é um filme arrebatador, consegue ser divertido e fazer a diferença incomodando os mais conservadores. Nesse caso, ponto para Jim Carrey, que trocou a segurança de mais um sucesso abobalhado pela ousadia de um papel inovador. Por essas e outras que ele é um grande ator, ainda que muitos insistam e enxergá-lo apenas como um careteiro.

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