terça-feira, 1 de março de 2011

Da surpresa à decepção


Se existe algo deprimente é ver alguém notadamente de talento se perder na carreira e afundar na mediocridade. Por razões que a razão desconhece, parece que este vem sendo o caminho trilhado pelo indiano M. Night Shyamalan, que em 1999 surpreendeu o mundo com o fascinante ‘O Sexto Sentido’. Aos poucos, aquele que chegou a ser apontado como o discípulo de Alfred Hitchcock nos anos 2000 foi perdendo a mão e chegou a sua mais recente obra, o enfadonho ‘A Dama na Água’.
Quando apareceu para o mundo com ‘Sexto Sentido’, Shyamalan nos apresentou uma fórmula que de fato remetia aos momentos mais brilhantes da história do cinema de suspense: um roteiro bem amarrado, planos longos e calmamente estudados, diálogos sucintos e o elemento surpresa do final, que acabou se tornando sua marca registrada. A fórmula ainda funcionou bem em ‘Corpo Fechado’, mas deu indícios de esgotamento em ‘Sinais’, o que acabou se confirmando com o sofrível ‘A Vila’.
Talvez percebendo esse desgaste, o diretor decidiu fugir um pouco de seu estilo tradicional. Ao invés do suspense permeado por reviravoltas, ‘A Dama na Água’ traz uma história de fantasia, ou como diz o slogan do filme, “uma história de ninar para adultos”. Lamentavelmente, o tiro acabou saindo pela culatra. Ao tentar criar uma história de mistério com toques infantis, o cineasta realizou um filme confuso, que arranca risos quando deveria assustar e constrange quando se pretende fazer dramático.
A história é a seguinte: Cleveland (o excelente Paul Giamatti, uma das poucas coisas que se salvam no filme), o tímido síndico de um prédio, encontra numa noite uma adolescente nadando na piscina. Ao conhecer a garota, de nome Story (Bryce Dallas Howard), descobre que ela na verdade é uma ‘narf’, um ser que habita um certo mundo aquático e é perseguido por criaturas ferozes. A missão de Cleveland, junto com outros habitantes do condomínio, é fazer com que ela possa retornar ao seu mundo sã e salva.
O problema maior de ‘Dama na Água’ é não conseguir se firmar como um filme de fantasia, da maneira como faz com destreza Tim Burton, por exemplo. O roteiro é construído com uma fragilidade assustadora, tudo soa forçado demais, desde as explicações para os acontecimentos ao encaminhamento das soluções. Nem mesmo as criaturas do mal conseguem convencer o espectador de que estão ali para assustar.
Menos mal que a principal virtude do trabalho de Shyamalan continua presente: a paciência para contar histórias, com planos longos, enquadramentos cuidadosos e cenas que parecem ter sido montadas com a precisão de quem realmente ama a sétima arte. O diretor até se dá à liberdade de brincar com alguns clichês cinematográficos, que resultam em uma sacada interessante, porém um tanto deslocada.
Isso comprova que o diretor realmente possui talento e que está um nível acima da grande maioria de seus colegas de Hollywood. O que teria acontecido então? Soberba? Desleixo? Confiança excessiva? Somente o tempo dirá, se Shyamalan vai se firmar como um cineasta que marcou época ou simplesmente “aquele que fez ‘O Sexto Sentido’”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário