sexta-feira, 11 de março de 2011

Da favela para as telas

 
Da mesma maneira que ‘Cidade de Deus’ se tornou uma referência no cinema nacional, seu principal derivado, a série televisiva ‘Cidade dos Homens’ também deixou sua marca na TV. Primeiro por colocar na telinha de uma maneira mais realista o cotidiano das favelas, com sua gente, seus problemas e suas virtudes. Segundo por levar à teledramaturgia uma estética e uma narrativa mais próximas do cinema, fazendo o caminho inverso do que vinha acontecendo (a linguagem televisiva se apropriar da produção cinematográfica). Como todos os produtos televisivos bem-sucedidos no Brasil, era natural que a série ganhasse uma versão para tela grande. E, se não traz grande novidade em relação ao seriado original, ‘Cidade dos Homens’, o filme, está longe de decepcionar.
‘Cidade dos Homens’ é resultado de um projeto que começou em 2001, antes de todo o rebuliço causado por ‘Cidade de Deus’. O curta-metragem ‘Palace 2’ mostrava dois meninos que, para conseguir dinheiro para um show, tentavam suas artimanhas em meio ao cotidiano violento da favela. No ano seguinte os protagonistas Acerola (Douglas Silva) e Laranjinha (Darlan Cunha) ganharam a série global, exibida com ótima recepção até 2005.
No filme ‘Cidade dos Homens’ a dupla já está com 18 anos, deixando as molecagens da adolescência para assumir as responsabilidades da vida adulta. Acerola ainda não consegue ser maduro o suficiente para cuidar do filho pequeno. Laranjinha, por sua vez, segue obstinado na ideia de encontrar o pai que nunca conheceu. O que não muda é a realidade violenta do morro, marcada pela guerra entre traficantes rivais. Ainda que jamais tenham enveredado pelo crime, os dois personagens não têm como livrar-se de sua interferência.
A qualidade maior do seriado televisivo era mostrar que a realidade nas favelas do Rio de Janeiro é violenta, sim, mas que lá residem seres humanos como outros quaisquer. Ainda que a criminalidade e a violência fossem o pano de fundo (até porque não se pode ignorar sua força), as histórias se concentravam na vida sentimental, nas relações familiares e de amizade, sempre temperadas com emoção e humor. O único demérito da versão cinematográfica talvez tenha sido mergulhar demasiadamente no interior dos personagens, tirando um pouco do foco coletivo.
A questão central do filme é paternidade. Enquanto Acerola se esforça para ser um pai de verdade, Laranjinha tenta descobrir o que é isso. Um enfrenta a transposição para a vida adulta, enquanto o outro busca recuperar a tempo o que perdeu na infância. Essa busca terá desdobramentos para os dois lados, chegando inclusive a interferir na relação entre ambos. Com isso, o diretor Paulo Morelli tira um pouco os olhos da favela para investir nos conflitos psicológicos da dupla. E parte da simpatia da série acaba se perdendo.
Isso não significa, porém, que ‘Cidade dos Homens’ seja um filme ruim, muito pelo contrário. O elenco, mais uma vez formado por jovens saídos das favelas, demonstra naturalidade, as cenas de conflito continuam realistas e extremamente bem filmadas e o roteiro se desenvolve sem grandes problemas. Como a comparação é inevitável, pode-se dizer que está um pouco aquém dos melhores episódios da série. O que já é um elogio.

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