sexta-feira, 11 de março de 2011

‘Cinemão’ de poucas virtudes

 
Houve um tempo em que Hollywood era fascinada por grandes produções de época, com histórias geralmente baseadas em clássicos literários, cenários pomposos e figurinos luxuosos. Filmes dessa natureza costumavam ser francos favoritos ao Oscar e arrebanhar o público em geral. Os tempos mudaram, a Academia deixou um pouco de seu conservadorismo de lado e tais produções perderam parte de seu chamariz. Mas ainda se fazem presentes, tal qual ‘Desejo e Reparação’, tido inicialmente como um dos favoritos ao Oscar deste ano, mas que terminou com apenas uma estatueta, de trilha sonora. Sinal dos tempos? É possível, mas que os méritos do filme não colaboraram para uma melhor sorte, isso também é fato.
‘Desejo e Reparação’ é um exemplo típico daquilo que os críticos convencionaram chamar de ‘cinemão’: obras que recorrem a elementos clássicos da dramaturgia (romance e tragédia), também procurando encher os olhos do espectador com uma produção técnica requintada. O diretor Joe Wright já havia sido bem-sucedido nesse filão com ‘Orgulho e Preconceito’, adaptação da obra-prima da escritora Jane Austen. Mas se naquele filme o tom era leve, mais próximo de uma comédia romântica, aqui a narrativa é mais complexa, pesada e dramática.
A obra escolhida dessa vez foi ‘Reparação’, do inglês Ian McEwan. Passada no ano de 1935, a história traz como personagem principal Briony (Saoirse Ronan, indicada ao Oscar de atriz coadjuvante), uma garota de 13 anos provida de uma imaginação fértil, que lhe permite escrever peças teatrais. Essa mesma imaginação fará com que ela acredite que um empregado da casa, Robbie (James McAvoy, de ‘O Último Rei da Escócia’) tenha seduzido sua irmã mais velha, Cecilia (Keira Knightley), e tentado violentar sua prima. As conseqüências desse devaneio serão trágicas para todos os envolvidos.
Em sua primeira parte, ‘Desejo e Reparação’ funciona bem, mostrando a cadeia de eventos que resulta na tragédia familiar. É onde se nota a habilidade do diretor em transpor para as telas uma trama literária épica detalhista e minuciosa, coisa para a qual nem todos têm a destreza devida. O jogo de cena entre real e imaginário, a espiral de tensão que se forma na cabeça da jovem Briony são levados ao espectador com precisão, alimentados pela atuação equilibrada dos atores.
Quando se passa à segunda parte, porém, começam os problemas. O clima de tensão se dissipa para dar lugar a um dramalhão arrastado que parece interminável. Robbie é mandado para a guerra, Cecilia tenta sobreviver como enfermeira e Briony segue atormentada pela culpa da injustiça cometida. O filme cai então em um ritmo enfadonho, com doses novelescas e interpretações exageradas. A redenção vem somente nos minutos finais, com a surpresa do desfecho protagonizado pela veterana Vanessa Redgrave.
Como em toda a produção do gênero, há de se enaltecer o primor dos figurinos, da direção de arte e da fotografia, com destaque para um virtuoso plano seqüência de quase seis minutos em um cenário de guerra. Tudo isso, porém, é insuficiente para salvar ‘Desejo e Reparação’ e colocá-lo no patamar de ‘cinemão’ de primeira linha. Não que o gênero esteja precisando se reinventar, mas é preciso um algo a mais para reconquistar o espectador.

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