quarta-feira, 2 de março de 2011

Cinema para desafiar


Numa época em que criatividade é artigo de luxo entre os cineastas, toda a repercussão em torno de ‘A Origem’ é fácil de compreender. Em meio à enxurrada de continuações, adaptações e refilmagens que tem dominado as salas de cinema, qualquer história com o mínimo de originalidade e engenhosidade é merecedora de elogios. E, goste-se ou não do novo filme de Cristopher Nolan, a verdade é que não se pode tirar dele este mérito: de elaborar uma narrativa que fuja dos padrões e faça o espectador usar a massa cinzenta.
Se você é daqueles que gosta de ir ao cinema para relaxar, se empanturrar de pipoca e ficar trocando ideias com o companheiro, melhor ficar em casa ou escolher alguma comédia romântica. Em ‘A Origem’, qualquer piscadela ou desvio de atenção pode fazer com que você se perca na trama. É uma história cheia de detalhes, construída a cada cena por meio de diálogos carregados de informação. Duvida?
Resumidamente, a história é a seguinte: Don Cobb (Leonardo Di Caprio) é um profissional de espionagem que comanda uma equipe altamente qualificada. Seu trabalho é roubar segredos das pessoas por um método nada convencional: invadindo seus sonhos. Quando seu último trabalho dá errado ele recebe uma proposta desafiadora: ao invés de roubar, implantar uma ideia na mente de um poderoso empresário. O procedimento é chamado ‘inception’, título original que no Brasil foi transformado no bisonho e inexplicável ‘A Origem’.
Este é um daqueles filmes em que, quanto menos você souber a respeito da trama, melhor. Tanto que ela foi mantida em sigilo pelos produtores até as primeiras exibições. Aos poucos, o diretor (que já havia demonstrado sua engenhosidade narrativa contando uma história de trás para frente em ‘Amnésia’) vai desvelando todos os procedimentos que envolvem a técnica de adentrar nos mistérios do sono. E dá-lhe informações ‘técnicas’, tramas e subtramas construídas com riqueza e paciência assombrosas.
Por mais complexa que seja, a trama de ‘A Origem’ é envolvente. Mais do que construir um roteiro intrigante, Nolan conseguiu fazer com que ele prendesse a atenção do espectador do primeiro ao último minuto. Mesmo inserindo uma história amorosa pouco convincente e algumas sequências de ação inverossímeis, são poucos os buracos que dão margem para que nos desliguemos da narrativa. Sem contar que o diretor se cercou de um elenco de primeira linha: Ken Watanabe, Joseph Gordon-Lewitt, Ellen Page, Cillian Murphy, Marillon Cotillard, Michael Caine... 
E, claro, não podemos nos esquecer do visual. Para construir o cenário em que se desenvolvem os sonhos de seus personagens, Nolan usou e abusou de efeitos especiais impressionantes. Uma Paris que se dobra, lutas em gravidade zero, uma cidade abandonada que se desmancha como areia são algumas das atrações oníricas boladas pelo diretor, que se firma cada vez mais como um dos grandes talentos da nova geração. Alguém que, se não inventa a roda, pelo menos luta contra a mesmice de Hollywood, explorando novos caminhos e ideias. Mais do que talentoso, é um desafiador, algo de que nosso cinema anda muito carente.

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