quarta-feira, 9 de março de 2011

A anticomédia romântica

De todos os gêneros cinematográficos previsíveis, nenhum consegue atingir o nível de previsibilidade das comédias românticas. Em alguns casos, apenas de olhar o cartaz do filme você já sabe como a história começa, o que irá se desenrolar e qual seu desfecho. A impressão que se tem é que o público desse tipo de filme não quer ser surpreendido de maneira alguma, exige a sua trama água com açúcar sob pena de recorrer ao Procon mais tarde. Seria possível então inovar o gênero, subvertê-lo e injetar algo que o faça ganhar vida nova? Eu imaginava que não, mas a prova viva está em ‘500 Dias com Ela’, talvez a menos romântica das comédias românticas já realizadas.
Tamanho frescor teria que vir de um cineasta estreante. Pois eis Marc Webb, que pode ser debutante no cinema, mas possui uma ampla e premiada carreira como diretor de videoclipes. Essa escola mais amaldiçoada que exaltada também tem seus pupilos promissores, que não pensam apenas em realizar videoclipes estendidos para a tela grande. A bem da verdade, o diretor se cercou de uma equipe jovem, de pouca experiência, mas muito talento. Da dupla de roteiristas, Scott Neustadter e Michael R. Weber, ao bem selecionado casal de protagonistas.
Logo de início um narrador avisa: essa não é uma história de amor, é uma história sobre o amor. A premissa é a que move o cinema desde os seus primórdios: um rapaz encontra uma garota e eles se apaixonam. Ops! Não exatamente. Tom (Joseph Gordon Levitt) é um arquiteto frustrado que trabalha numa empresa que produz cartões. Lá ele conhece Summer (Zooey Deschannel), por quem se sente atraído desde o primeiro encontro. De maneira não linear, a narrativa relata os 500 dias que separam esse acontecimento do fim definitivo do relacionamento.
Há muitas coisas que fazem de ‘500 Dias com Ela’ um filme diferenciado. Em primeiro lugar o casal de protagonistas. Ao invés de um galã descolado, esbanjando charme à la Cary Grant, Tom é um quase loser. Não é muito bonito, é sensível como uma porcelana e sonha com um relacionamento estável. Summer é o oposto: de uma beleza encantadora, independente e desencanada. É uma espécie de antiquímica, que atrai os dois, mas é sabido que tem seu prazo de validade.
O segundo diferencial é a narrativa. Na história clássica, o casal se conhece, se apaixona, briga e retorna em definitivo em um final triunfante. Aqui, o diretor entrega logo de cara que não haverá final feliz. Pelo menos não nos moldes tradicionais. Para intensificar a montanha russa de emoções e sentimentos, a ação vai e volta no tempo, entre o pré e o pós-rompimento. E o que seria um contra-senso se torna um dos trunfos do filme: mesmo sabendo qual será o desfecho, o espectador tem sua expectativa alimentada pelo que aconteceu nesse meio tempo e impediu o happy end.
‘500 Dias com Ela’ não escapa dos clichês dos filmes ‘descolados’: tem diálogos sagazes, referências pop, trilha sonora moderninha e maneirismos visuais. Mas tudo muito equilibrado, sem exageros ou pretensões de ser o novo Tarantino. É daqueles filmes que te faz passar alguns dias com um sorriso estampado no rosto.

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