sábado, 12 de março de 2011

A amarga estrada da vida

 
O título de um filme, ou alguma outra obra, às vezes diz muito mais do que parece à primeira vista. Tomemos como exemplo a história de um casal infeliz intitulada ‘Revolutionary Road’, na tradução literal ‘estrada revolucionária’. Mais do que o nome da via onde residem os protagonistas, é uma expressão carregada de simbolismos e de uma certa ironia venenosa que chega a cortar o coração. No Brasil, essa síntese poderosa foi reduzida a ‘Foi Apenas um Sonho’, título adequado para um melodrama, mas que acaba por obscurecer algumas das principais virtudes dessa interessante produção.
Retratos familiares são uma especialidade do diretor Sam Mendes, revelado ao mundo com o sarcasmo quase melancólico de ‘Beleza Americana’, que zombava dos podres escondidos na classe média norte-americana dos anos 90. Após passear por outros gêneros, o cineasta voltou ao círculo familiar para desnudar sentimentos que se escondem por trás de uma aparente felicidade. Mas dessa vez, o bom humor foi deixado de lado. ‘Foi Apenas um Sonho’ mergulha na tristeza sem dar chance ao espectador de se descontrair. No máximo, um discreto sorriso esboçado vez ou outra.
Baseado no romance do escritor Richard Yates, o filme nos apresenta um jovem casal dos anos 50, Frank (Leonardo DiCaprio) e April (Kate Winslet). Ele tem um emprego burocrático em uma grande empresa. Não é o trabalho de seus sonhos, muito pelo contrário, é algo que detesta, mas o suficiente para garantir-lhe uma condição financeira confortável. Ela sempre quis ser atriz, mas deixou os planos de lado para se estabelecer como dona de casa.
Apesar de se mostrarem um casal exemplar, Frank e April alimentam um sentimento de infelicidade, um vazio existencial que não conseguem preencher. Até que um dia parecem ter encontrado a solução: os dois decidem se mudar para Paris, sem grandes planos traçados, revivendo um sonho de juventude. Aos poucos, porém, esse sonho vai sendo esmagado pela realidade da qual eles não conseguem se desvencilhar. E a estrada revolucionária do início vai se perdendo por caminhos tortuosos.
Escrita em 1961, a obra original retratava um sentimento de inconformismo que permanece atual até os dias de hoje. O que difere da grande maioria dos melodramas é o tom pessimista, amargo, que insiste em não se desfazer para alimentar um ‘happy end’. É o tipo da narrativa que nos derruba e não oferece a mão para levantarmos.
Leonardo DiCaprio e Kate Winslet voltam a fazer par romântico doze anos depois do estrondoso sucesso de ‘Titanic’. Como o tempo é sábio, os dois se revelam atores muito mais talentosos e maduros do que àquela época. DiCaprio, ainda que mantenha a eterna cara de adolescente, tem uma atuação precisa e segura. Kate, por sua vez, é a dona do filme. Ao mesmo tempo forte e frágil, consegue roubar algumas cenas apenas com o olhar. Cabe destacar ainda a participação de Michael Shannon, indicado ao Oscar de ator coadjuvante no papel de um homem com problemas mentais. É ele quem diz as grandes verdades ao casal, revelando o que cada um insiste em esconder de si mesmo e apontando o ‘vazio sem esperança’ do qual parece não haver escapatória.

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