domingo, 29 de maio de 2011

Mais que um filme de boxe


Filmes sobre boxe podem ser considerados um gênero à parte no meio cinematográfico. Mais do que qualquer outro esporte, a ‘nobre arte’, como é chamada por seus admiradores, tem uma interessante capacidade de render matéria prima para filmes, desde o emblemático ‘Rocky, o Lutador’, o dramalhão ‘O Campeão’ ou o histórico ‘Touro Indomável’, entre tantos outros. Mais curioso é que o mote dessas produções é basicamente o mesmo: a história do pugilista de talento que, por força das circunstâncias, sucumbe e depois alcança a redenção. ‘O Vencedor’ não foge dessa linhagem, mas se destaca por ser muito mais um filme sobre pessoas do que sobre boxe em si.
Baseado em fatos reais, ‘O Vencedor’ tem como protagonista o boxeador Micky Ward (Mark Whalberg), tido como um talento promissor, mas cercado por uma verdadeira fauna familiar. O irmão Dicky Eklund (Christian Bale), seu treinador, já foi profissional e tem no currículo o feito de ter derrubado o campeão Sugar Ray Leonard. Na atualidade, porém, está consumido pelo vício em crack. Alice, a mãe e empresária (Melissa Leo), é uma perua possessiva e controladora. Para completar o time, sete irmãs intrometidas e desocupadas, todos controlando a vida e a carreira do lutador.
Quando Micky começa a namorar Charlene (Amy Adams), uma garçonete desbocada, surge uma nova voz em sua consciência, colocando-o em confronto com a família. Esse conflito de interesses e possibilidades é o que move ‘O Vencedor’, dirigido com extrema competência por David O. Russell (mais conhecido por ‘Três Reis’). Isso porque o cineasta conseguiu enxergar na figura de cada um desses personagens que gravitam ao redor de seu protagonista uma riqueza muito maior do que a trajetória das lutas no ringue.
É interessante como o roteiro consegue colocar no espectador o ponto de vista de cada um deles. Uma hora a de Dicky, que deseja ver no irmão o campeão que não conseguiu ser. Em outra a da mãe, que alimenta a mesma necessidade, ampliada pelo temor de perder o filho. Em seguida temos o de Charlene, que nos coloca para fora da família para enxergar o turbilhão de pressões e frustrações em que seu namorado está metido. E, por fim, o de Micky, um sujeito inseguro que não sabe para onde ir diante de tanta gente querendo mandar na sua vida.
Por seus papéis, Christian Bale e Melissa Leo arrebataram os Oscar de coadjuvantes deste ano. A eles se soma a também indicada Amy Adams, que forma um conjunto de interpretações intensas, sem o qual o filme não teria a mesma força. Méritos também para Mark Whalberg, que pode não ter chamado a atenção nas premiações, mas cuja interpretação mais contida se enquadra exatamente naquilo que representa seu personagem.
O mais curioso de ‘O Vencedor’ é seu ponto fraco, as cenas de luta. Diferente da intensidade aplicada nos filmes do gênero, a câmera passeia pelo ringue como as das transmissões televisivas, sem pulsar junto com os lutadores. Seu vigor está além das cordas, dos socos e da vibração da plateia. Está no embate familiar e de egos, pujante como um campeão e certeiro como um golpe bem trabalhado.

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